quinta-feira, 14 de abril de 2011

Dar o salto ou 'ir a salto' 4

O mecanismo do bode expiatório e a violência mimética

Um dos mecanismos básicos de poder social é o do 'bode expiatório', muito relembrado nos últimos anos pela renomeação como 'bullying' e sua proliferação nas escolas. Deixando de lado especificidades, em termos sócio-antropológicos a coisa é simples: escolhe-se um alvo, exploram-se as suas fragilidades e propagandeia-se a sua culpa em relação a algo ou até, simplesmente, o seu repúdio. Se corre bem, consegue-se convencer muitos e, em alguns casos, o próprio aceita a sua culpa ou/e o seu próprio repúdio. No final celebra-se colectivamente a humilhação, a exclusão, enfim a morte, simbólica ou não, do bode expiatório como culpado de todo o mal acreditando-se numa renovação a partir daí. Se a coisa corre mal e a vítima não se aceita como tal, e consegue também reunir o seu séquito, pode entrar-se numa 'violência mimética' entre dois ou mais grupos que pode mesmo contaminar todos. Por vezes, se aparece um oponente mais forte estranho aos dois ou mais grupos que se guerreiam, estes podem juntar-se - às vezes apenas circunstancialmente - para se oporem a esse inimigo comum. Todos estes mecanismos se evidenciam no actual momento político, quer na arena central da política, quer no quotidiano, nas conversas que vão surgindo aqui e ali.

O mecanismo do 'bode expiatório' tornou-se central desde o início e continua a acompanhar e mesmo a estruturar a campanha eleitoral. Em resposta iniciou-se a 'violência mimética', ou seja, se Passos Coelho e o PSD são culpados da crise política, Sócrates e o PS são culpados da crise económica e social. Cada um chamou a malta do seu bairro e é vê-los entretidos na violência mimética de tal forma que pouco falam do oponente mais forte de toda esta brincadeira: os 'mercados', essa figura mítica e mágica que os economistas (esses feiticeiros modernos) inventaram, e os rituais das agências de rating que fazem com que a magia se torne real, ainda que nem os economistas a consigam explicar. De certo modo é natural: o monstro depois de criado ganhou autonomia ainda que não haja 'mãos invisíveis' mas pessoas e estratégias que, como em relação a 2008 , estou certo que serão descobertas mais tarde ou mais cedo. PS e PSD, no seu pragmatismo, deixaram de falar deste oponente maior que aí contínua a manter os juros da divida elevados, independentemente do 'resgate'. O Bloco e o PCP foram os únicos a falar desse oponente maior e da necessidade de o colocar em causa.

Pois o que me parece é que nos vamos entreter com os 'bodes expiatórios' internos e a 'violência mimética' enquanto o Deus 'Mercados' (um deus de muitas cabeças) vai exigir mais 'sacrifícios' porque não está satisfeito. E se também não está ainda satisfeito com a Irlanda e a Grécia, é porque os objectivos do Deus 'Mercados' são muito altos. O que quererá de nós, mortais, o Deus 'Mercados'?

Eu assinei a petição: A Relevância das Agências de Rating e o Risco de Abuso de Posição Dominante - http://www.peticaopublica.com/PeticaoVer.aspx?pi=denuncia

E já agora, a propósito, se puderem leiam o livro do Rui Zink - Destino Turístico

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